Continuidade da audiência fraude de Gean é suspensa por determinação judicial

“Continuação da Audiência Pública que seria realizada dia 6/1, para revisão do Plano Diretor, foi CANCELADA novamente pelo TJ-SC por não respeitar o prazo legal de divulgação com 15 dias de antecedência!

Na decisão, a juiza de plantão Daniela Vieira Soares solicita nova publicação de nova data, “sob menção da existência deste mandato de segurança, na forma acima explicita, sob pena de configuração de crime de desobediência”.

Fonte: Instagram da Coletiva Bem Viver

Verão roubado: prefeitura de Florianópolis ignora ômicron e marca 15 Audiências Públicas em janeiro

Publicado originalmente no blog Jornalismo e Cidade, por Míriam Santini de Abreu.

SEMANÁRIO: O PLANO DIRETOR NA MÍDIA – 2 

AUDIÊNCIAS DE BACIADA

O primeiro dia útil de janeiro começou com a divulgação, pela administração Gean Loureiro, do Edital de Convocação de Audiências Públicas Distritais sobre as mudanças no plano diretor de Florianópolis. As 13 serão no mesmo dia e hora, 15 de janeiro, das 16 às 20 horas. Mudam apenas os locais. Todas serão presenciais. A Audiência Final Geral será dia 24, com início às 18 horas e encerramento às 22 horas, na Câmara Municipal de Vereadores, onde, no Plenário ou no Plenarinho, mal cabem 60 pessoas. Há ainda uma Audiência marcada para o dia 6, continuidade daquela iniciada em 17 de dezembro na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. O cenário, como se sabe, é esse: a variante do coronavírus ômicron  pode já ser o vírus de mais rápida propagação de toda a história. 

Pelo grupo ND, foi anunciado que a prefeitura montaria uma “força-tarefa” e divulgaria a dinâmica de funcionamento das audiências em convocação na edição de 30 de dezembro do Diário Oficial. Mas, misteriosamente, o site da Prefeitura pifou no feriadão, como acusou o vereador Afrânio Boppré (PSOL) no Instagram (na foto). O site voltou a funcionar hoje (3/1) exibindo o Edital com data de 30/12. Isso não é mero detalhe: a Resolução 25 do Conselho das Cidades, que rege esses prazos, diz que a população deve conhecer o cronograma e os locais das reuniões com antecedência de no mínimo 15 dias. Já tem um furo aí. E há outros: os conselheiros da cidade e de entidades representativas só poderão participar de uma audiência, pelo fato de serem todas ao mesmo tempo, e quem trabalha à tarde também ficará impedido de participar. 

ATROPELO E OMISSÃO

A pressa da prefeitura é tanta que as Audiências Públicas Distritais serão realizadas antes do prazo final da chamada Consulta Pública, que é 18 de janeiro, para enviar considerações, dúvidas e questionamentos sobre o texto da minuta do plano diretor e seus respectivos anexos. Até essa segunda, havia 294 manifestações no site da prefeitura, muitas delas propondo alterações na minuta. Como as Audiências Públicas Distritais serão dia 15, as propostas que aparecerem nesses três dias não poderão ser apreciadas pelos moradores nos bairros. Como a prefeitura vai lidar com essas propostas? Também não se sabe quem coordenará as 15 Audiências Públicas Distritais nem como a tal força-tarefa se estruturará com quadros técnicos (15 ao mesmo tempo) para dar conta das dúvidas dos moradores. 

MÍDIA QUE NÃO INFORMA

O ND publicou no final da manhã de hoje o release da prefeitura sobre as Audiências, sem questionamentos. Já o DC há tempos tem cobertura estadualizada, e passa batido o cotidiano da capital. Os veículos não têm mais a figura do “setorista” nas câmaras de vereadores, prefeituras e na Assembleia Legislativa. Era um trabalhador jornalista que lia os Diários Oficiais e ficava de olho nas sessões e no dia a dia do poder. Agora, restam apenas os chamados releases, enviados pelas repartições públicas aos veículos e publicados como se o próprio veículo integrasse a repartição. De vez em quando aparece um escândalo que gera notícia, muitas vezes replicando a repercussão nas redes sociais. Nesse triste quadro, as fontes de entrevista são quase sempre institucionais: prefeito, vereadores, secretários. O espaço para as fontes vindas dos movimentos populares é estreito ou nulo. Vale lembrar que jornais e portais são empresas. Mas rádios e tevês funcionam sob concessão pública e também negam o debate público. Era para já termos reportagens e cadernos temáticos discutindo a cidade, publicizando os diferentes pontos de vista e divergências sobre o plano diretor. Mas quê… Isso é miragem no nosso deserto noticioso.

Colunismo de Florianópolis: porta-vozes da ideologia urbanística da Prefeitura no plano diretor

Publicado originalmente no blog Jornalismo e Cidade, por Míriam Santini de Abreu.

Intervenção dos movimentos sociais na audiência do plano diretor 17/12
Audiência Pública de 17 de dezembro de 2021

SEMANÁRIO: O PLANO DIRETOR NA MÍDIA – 1 


SOB O SOL DE JANEIRO 
Os colunistas do jornal ND, do grupo de mesmo nome, vem se prestando ao papel de porta-vozes da administração Gean Loureiro em relação ao novo golpe que se anuncia para mudar o plano diretor de Florianópolis. Na edição conjunta de 31, 1º e 2 de janeiro, sob o título “A força-tarefa do Plano Diretor”, a coluna Bom Dia, de Fabio Gadotti, abre espaço para o superintendente do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF), Carlos Alvarenga, anunciar que as 13 Audiências Públicas Distritais – que a legislação exige – serão realizada em um mesmo dia, 15 de janeiro, a partir das 16 horas, todas ao mesmo tempo, em pleno horário comercial e no auge do verão. Escreve o colunista: “Alvarenga disse que o Ipuf vai fazer ampla divulgação nos bairros para incentivar a participação da população”.
Sério?! Só se as audiências forem sob guarda-sol na praia. 


CIDADE JUDICIALIZADA POR QUEM? 
A mesma coluna, na edição de 28 de dezembro, sob o título “Cidade judicializada”, critica as decisões judiciais para suspender a Audiência Pública que seria realizada em 27 de dezembro – sim, 27 de dezembro! – como continuidade daquela feita pela Prefeitura em 17/12, e para suspender as obras que irão afetar o entorno da Praça XV sem parecer de órgãos ligados ao patrimônio histórico e artístico. Afirma o colunista: “São exemplos de uma cidade refém da judicialização – proposta por segmentos que discordam de políticas públicas e projetos de quem foi eleito para governar – e que acaba encontrando guarida no Ministério Público e no Judiciário”.


O resultado da eleição implica silenciamento das discordâncias?


Na mesma edição, o colunista Moacir Pereira, sob a nota intitulada “A Ilha e as forças do atraso”, compara Florianópolis e Balneário Camboriú para afirmar que na capital existe “ativismo ideológico” e que “as esquerdas” tem apoio do Ministério Público e “vetam tudo”. É a atualização de um discurso nascido no início dos anos 1990 e direcionado aos “contra”, como se dizia na época e ainda hoje, buscando tachar a esquerda de ideológica, reservando aos grupos dominantes a legitimidade para planejar a cidade.
 
INSCRIÇÃO PRÉVIA E AUTORITARISMO 
O profundo autoritarismo que já marca as discussões sobre o plano diretor de Florianópolis ficou evidente na Audiência Pública convocada pela Prefeitura na noite de 17 de dezembro na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Na ocasião, o que se viu foi uma completa desorganização da mais estreita possibilidade de manifestação concedida, a “inscrição prévia” de fala de 2 minutos. Muita gente que se inscreveu – pela internet ou de forma presencial – não conseguiu falar porque às 22 horas era preciso encerrar e desocupar o Auditório. Isso levou à convocação para a tal prorrogação da Audiência em pleno 27 de dezembro, suspensa por uma medida liminar da justiça.


Naquela noite, o auge foi o momento em que um participante levantou questão de ordem para saber qual era o caráter daquela audiência, ou seja, o que se faria com o que fosse nela debatido. O superintendente do Florianópolis (IPUF), Carlos Alvarenga, que é formado em Direito, se negou a dar palavra e em meio aos protestos afirmou:
– Se não for respeitada a ordem de fala e a ordem da audiência pública, eu vou pedir à segurança para tomar providências.
Vereadores foram até a mesa pedir que cedesse e ele mais uma vez respondeu:
– Eu só estou pedindo que seja respeitada a ordem pública, ordem pública tem inscrição prévia. É ordem pública. Se não for respeitada a ordem pública, nós temos medidas a serem feitas.


A noção de ordem pública vem do sistema de justiça criminal e de repressão estatal. Na audiência, essa “ordem pública” se restringia à mera inscrição prévia cuja lista não foi publicizada, tendo inclusive a mesa que coordenava o evento, pelos critérios adotados, dado direito de fala duas vezes para uma mesma pessoa, como denunciaram participantes que não puderam se manifestar.


O propósito de controlar em nome da “ordem pública” é tão autoritário que o superintendente do IPUF ameaçou pedir providências à segurança se não se respeitasse a ordem de fala.


O discurso, alertava o intelectual francês Henri Lefebvre, exerce um terrorismo, torna a fala proscrita. O discurso da “ordem pública” naquela audiência foi desmascarado pela completa desordem do que buscava legitimar, a inscrição prévia.


Idealizador da ideia do direito à cidade, Lefebvre, em artigo no livro “Du Contrat de Citoyenneté”, publicado em 1990, lista o que nomeia como “Os novos direitos do cidadão”. Entre eles estão o direito à informação e o direito à expressão. Diz Lefebvre que um cidadão não deve nem pode ficar calado sobre o que o preocupa e que lhe diz respeito, mesmo que apenas indiretamente: “Isso é muito: todos os assuntos da sociedade preocupam todos os membros. Daí o direito de refletir, de falar, de escrever” (p. 34).


Cabe acompanhar, neste ano de 2022 que chega, em que grau a “ordem pública” deixará se expressarem esses direitos em relação aos rumos da cidade de Florianópolis.